A
recente valorização do dólar frente ao real foi amplamente comemorada pelo
governo. O câmbio depreciado auxiliaria as exportações do país, ao mesmo tempo
em que reduziria as importações. Nesse sentido, a demanda agregada do país
seria elevada – algo bom para a economia.
Aliado
a isso, a queda consistente verificada nas taxas de juros opera no mesmo
sentido – possibilita uma elevação do consumo ao mesmo tempo em que o
investimento, ceteris paribus,
cresce. Custos menores incentivam consumidores a comprar e investidores a investir.
Essa
combinação de câmbio desvalorizando com taxas de juros em queda opera
positivamente na economia, estimulando-a.
Contudo,
cabe uma pergunta pertinente: É sustentável uma política que reduza taxas de
juros e desvalorize o câmbio simultaneamente?
O
próprio Banco Central (BACEN) utiliza em suas próprias projeções para inflação
futura quatro modelos VAR (vetores
autorregressivos). No modelo VAR1[1],
inclui-se as seguintes variáveis endógenas: variação da taxa de câmbio nominal,
variação da taxa SELIC real, inflação dos preços livres[2] e inflação dos preços
administrados[3].
Além disso, são inclusas 11 dummies
sazonais referentes a cada mês do ano e uma dummy
de tendência para o período de desinflação (janeiro de 1995 a junho de 1998).
Através do modelo VAR, é possível
prever a inflação futura e determinar a relação entre as variáveis do modelo.
Nesse
estudo, estimei esse modelo do BACEN utilizando duas defasagens, seguindo a
sugestão da instituição. Além disso, não foram recuperados os parâmetros
estruturais do modelo, visto que o objetivo desse estudo é prever a inflação
futura e determinar a relação entre as variáveis.
Dando
enfoque aos preços, apresenta-se a função impulso-resposta e a sobre os preços
livres e administrados, considerando um choque de dois desvios-padrão na
variação da taxa de juros real e na variação da taxa de câmbio.
Figura
1 – Função Impulso-resposta sobre os preços livres e administrados.
Fonte:
Elaboração do autor.
Claramente, percebe-se que a taxa de câmbio possui uma
influência maior do que a taxa de juros sobre os preços livres e administrados,
embora o efeito maior seja (naturalmente) sobre os preços livres.
Além
disso, os impactos da taxa de câmbio e das taxas de juros operam em sentidos
distintos: se por um lado, um choque positivo na taxa de câmbio tende a elevar
os preços, um choque positivo na taxa de juros tende a reduzir os preços.
Por
fim, ressalta-se que os efeitos dos choques se dissipam mais rapidamente
considerando a taxa de juros do que a taxa de câmbio. Ou seja, choques no
câmbio possuem um impacto mais longo sobre os preços, dissipando-se
aproximadamente a partir do décimo mês após o choque.
Constatado
que taxas de câmbio e juros operam sobre os preços, e considerando a disparada
do câmbio e queda dos juros, questiona-se se esse processo é sustentável.
Especificamente, ceteris paribus,
queda dos juros e depreciação cambial operam conjuntamente no sentido de se
elevar preços. Na conjuntura atual, a grande questão é a cláusula ceteris paribus (tudo o mais constante).
Dado o cenário de incertezas crescentes sobre a Europa e a “recuperação” da
economia americana, pressões deflacionárias possivelmente podem estar em cena.
Nesse sentido, os efeitos do câmbio e das taxas de juros podem estar sendo suavizados. Contudo, com o cenário internacional
melhorando e a economia brasileira crescendo mais robustamente no segundo semestre,
dificilmente manteremos esse cenário atual prevalecendo (juros caindo e câmbio
depreciando).
Cabe
ressaltar também que os efeitos da política monetária costumam aparecer com
defasagens temporais, normalmente após um semestre da alteração na política monetária.
Nessa circunstância, um problema adicional pode surgir: estaria sendo aberto no
Brasil espaço pra um salto inflacionário no cenário de retomada econômica antes
que o BACEN conseguisse alterar a trajetória altista em tempo adequado.
De
fato, uma retomada na economia mundial pode acabar alterando o quadro de
incertezas, fazendo com que a fuga para “portos seguros”, como o dólar, seja
revertida. Nesse caso, um novo influxo de dólares para o Brasil tenderia a
apreciar novamente nossa moeda, o que, ceteris
paribus, traria nova pressão baixista nas taxas de juros.
Por
fim, uma deterioração do quadro internacional aumentaria a saída de dólares,
depreciaria ainda mais a taxa de câmbio, o que por este canal, poderia surtir
efeitos nos preços (alta) e nas taxas de juros (alta). Ademais, a queda na
atividade econômica daria espaço para mais queda nos juros, criando para os
preços um cabo de guerra entre o canal do quadro internacional e do câmbio, que
provavelmente seria vencido pelo canal cambial[4].
Com
efeito, em resposta a pergunta sobre a sustentabilidade da redução das taxas de
juros e desvalorização do câmbio simultaneamente, conclui-se que depende do
cenário em vigência. No quadro atual, não se apresentam grandes conflitos
temporariamente. Contudo, em face de uma retomada significativa da economia
mundial e nacional, não se espante se as taxas de juros voltarem a subir no
Brasil.
[1]
Para maiores informações, consultar o site do banco central do Brasil.
[2]
Chamamos os preços de preços livres, aqueles que variam ao sabor do mercado.
Por exemplo, peixe, dos ovos e da carne vermelha.
[3]
Aqueles que não são determinados por essa dinâmica são chamados de preços
administrados. No caso deles, órgãos públicos determinam ou influenciam os
preços.
[4]
Na crise econômica recente, embora o PIB brasileiro tenha caído 0,33% em termos
reais no ano de 2009, a inflação anual medida pelo IPCA foi de 4,31%, evidenciando
assim, que a retração econômica não conseguiu frear os preços (o efeito cambial
operou positivamente nesse sentido).
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