25 junho 2012

Câmbio e Juros no quadro atual

 

A recente valorização do dólar frente ao real foi amplamente comemorada pelo governo. O câmbio depreciado auxiliaria as exportações do país, ao mesmo tempo em que reduziria as importações. Nesse sentido, a demanda agregada do país seria elevada – algo bom para a economia.

Aliado a isso, a queda consistente verificada nas taxas de juros opera no mesmo sentido – possibilita uma elevação do consumo ao mesmo tempo em que o investimento, ceteris paribus, cresce. Custos menores incentivam consumidores a comprar e investidores a investir.

Essa combinação de câmbio desvalorizando com taxas de juros em queda opera positivamente na economia, estimulando-a.

Contudo, cabe uma pergunta pertinente: É sustentável uma política que reduza taxas de juros e desvalorize o câmbio simultaneamente?

O próprio Banco Central (BACEN) utiliza em suas próprias projeções para inflação futura quatro modelos VAR (vetores autorregressivos). No modelo VAR1[1], inclui-se as seguintes variáveis endógenas: variação da taxa de câmbio nominal, variação da taxa SELIC real, inflação dos preços livres[2] e inflação dos preços administrados[3]. Além disso, são inclusas 11 dummies sazonais referentes a cada mês do ano e uma dummy de tendência para o período de desinflação (janeiro de 1995 a junho de 1998). Através do modelo VAR, é possível prever a inflação futura e determinar a relação entre as variáveis do modelo.

Nesse estudo, estimei esse modelo do BACEN utilizando duas defasagens, seguindo a sugestão da instituição. Além disso, não foram recuperados os parâmetros estruturais do modelo, visto que o objetivo desse estudo é prever a inflação futura e determinar a relação entre as variáveis.

Dando enfoque aos preços, apresenta-se a função impulso-resposta e a sobre os preços livres e administrados, considerando um choque de dois desvios-padrão na variação da taxa de juros real e na variação da taxa de câmbio.

Figura 1 – Função Impulso-resposta sobre os preços livres e administrados.

Fonte: Elaboração do autor.


            Claramente, percebe-se que a taxa de câmbio possui uma influência maior do que a taxa de juros sobre os preços livres e administrados, embora o efeito maior seja (naturalmente) sobre os preços livres. 

Além disso, os impactos da taxa de câmbio e das taxas de juros operam em sentidos distintos: se por um lado, um choque positivo na taxa de câmbio tende a elevar os preços, um choque positivo na taxa de juros tende a reduzir os preços.

Por fim, ressalta-se que os efeitos dos choques se dissipam mais rapidamente considerando a taxa de juros do que a taxa de câmbio. Ou seja, choques no câmbio possuem um impacto mais longo sobre os preços, dissipando-se aproximadamente a partir do décimo mês após o choque.

Constatado que taxas de câmbio e juros operam sobre os preços, e considerando a disparada do câmbio e queda dos juros, questiona-se se esse processo é sustentável. Especificamente, ceteris paribus, queda dos juros e depreciação cambial operam conjuntamente no sentido de se elevar preços. Na conjuntura atual, a grande questão é a cláusula ceteris paribus (tudo o mais constante). Dado o cenário de incertezas crescentes sobre a Europa e a “recuperação” da economia americana, pressões deflacionárias possivelmente podem estar em cena. Nesse sentido, os efeitos do câmbio e das taxas de juros podem estar sendo suavizados. Contudo, com o cenário internacional melhorando e a economia brasileira crescendo mais robustamente no segundo semestre, dificilmente manteremos esse cenário atual prevalecendo (juros caindo e câmbio depreciando).

Cabe ressaltar também que os efeitos da política monetária costumam aparecer com defasagens temporais, normalmente após um semestre da alteração na política monetária. Nessa circunstância, um problema adicional pode surgir: estaria sendo aberto no Brasil espaço pra um salto inflacionário no cenário de retomada econômica antes que o BACEN conseguisse alterar a trajetória altista em tempo adequado.

De fato, uma retomada na economia mundial pode acabar alterando o quadro de incertezas, fazendo com que a fuga para “portos seguros”, como o dólar, seja revertida. Nesse caso, um novo influxo de dólares para o Brasil tenderia a apreciar novamente nossa moeda, o que, ceteris paribus, traria nova pressão baixista nas taxas de juros. 

Por fim, uma deterioração do quadro internacional aumentaria a saída de dólares, depreciaria ainda mais a taxa de câmbio, o que por este canal, poderia surtir efeitos nos preços (alta) e nas taxas de juros (alta). Ademais, a queda na atividade econômica daria espaço para mais queda nos juros, criando para os preços um cabo de guerra entre o canal do quadro internacional e do câmbio, que provavelmente seria vencido pelo canal cambial[4].

Com efeito, em resposta a pergunta sobre a sustentabilidade da redução das taxas de juros e desvalorização do câmbio simultaneamente, conclui-se que depende do cenário em vigência. No quadro atual, não se apresentam grandes conflitos temporariamente. Contudo, em face de uma retomada significativa da economia mundial e nacional, não se espante se as taxas de juros voltarem a subir no Brasil.


[1] Para maiores informações, consultar o site do banco central do Brasil.
[2] Chamamos os preços de preços livres, aqueles que variam ao sabor do mercado. Por exemplo, peixe, dos ovos e da carne vermelha.
[3] Aqueles que não são determinados por essa dinâmica são chamados de preços administrados. No caso deles, órgãos públicos determinam ou influenciam os preços.
[4] Na crise econômica recente, embora o PIB brasileiro tenha caído 0,33% em termos reais no ano de 2009, a inflação anual medida pelo IPCA foi de 4,31%, evidenciando assim, que a retração econômica não conseguiu frear os preços (o efeito cambial operou positivamente nesse sentido).

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