A eclosão dos
protestos em 2013 no Brasil teve como origem as manifestações do Movimento
Passe Livre. A princípio, era apenas para ser um protesto contra aumento das tarifas
de passagens urbanas. Surgidas na cidade de São Paulo, as manifestações repudiavam
o aumento de R$0,20 no preço das passagens de ônibus e metrô, exigindo “tarifa
zero”. Mas tais protestos, de repente, se transformaram em manifestações
intensas, expandiram-se por todo o país, e fugiram do controle do Movimento
Passe Livre. O foco em cobrar “tarifa zero” do transporte público, foi
consequentemente, abafado. Novas demandas surgiram: mais educação, mais saúde,
mais segurança, et cetera...
Conforme
consta no site do próprio Movimento Passe Livre:
“Tarifa zero é o meio mais prático e efetivo
de assegurar o direito de ir e vir de toda população nas cidades. Essa idéia (sic) tem como fundamento o entendimento de que o
transporte é um serviço público essencial, direito fundamental que assegura o
acesso das pessoas aos demais direitos como, por exemplo, a saúde e a educação”.
Como muito
ressaltou o economista Milton Friedman, não existe almoço gratuito: no mundo
econômico, não existem bens gratuitos. Isso engloba o transporte: motoristas
cobram salários para trabalhar. Os veículos utilizados no transporte não caem
do céu: eles precisam ser fabricados. A gasolina não verte gratuitamente: ela
precisa ser produzida. Os mecânicos que reparam os veículos também cobram pelos
seus serviços. Não existem gentileza e gratuidade no sistema produtivo. Para a
infelicidade dos que demandam bens “gratuitos”, a realidade econômica é dura,
cruel e custosa.
Nunca houve e
nunca haverá transporte gratuito. Por mais grotesca e óbvia que aparenta ser
tal afirmação, não apenas há pessoas que não compreendem isto, como há aquelas que
exigem que isso ocorra, e mais, cooptam membros da sociedade para se engajarem
nessa luta.
Para o caso da
capital paulista, como consta neste link, demonstra-se que o custo real unitário da tarifa é de
R$4,13, sendo R$3,00 o preço ao passageiro e R$1,13 o subsídio (leia-se,
impostos) da prefeitura. Após deduzir todos os custos, há um lucro de R$0,13
por unidade de passagem vendida.
Naturalmente,
reduzir a taxa de lucro (ou acabá-la) é o método mais certo para se reduzir a
qualidade do transporte público (ou acabá-lo). A reivindicação, portanto,
consiste em elevar o subsidio público, de modo a criar uma “tarifa gratuita”.
Muitos membros
da sociedade concordam com essa reivindicação. Eles realmente acreditam que um
programa como “tarifa zero” seria adequado e/ou legítimo. Mas vamos aos fatos.
Novamente
esbarramos no problema da escassez e da inexistência de “almoço gratuito”. A
intenção em se implementar um programa de “tarifa zero” esbarraria, portanto,
na restrição orçamentária do governo –
que o subsidiaria completamente.
Assim como as
pessoas (até mesmo o homem mais rico do mundo), o governo também se depara com
renda limitada: ele deve, portanto, usar seus restritos recursos de modo a trazer
o máximo de bem-estar à sociedade ao menor custo possível.
Disso deriva a seguinte pergunta: como a sociedade pode ao mesmo tempo cobrar MAIS
educação, MAIS saúde, MAIS segurança... Sem dar a sua contrapartida, ou seja, os
impostos (estes
elevados reduzem a restrição orçamentária, possibilitando mais saúde, mais
segurança...)?
Restrição
orçamentária em termos práticos significa que para se aumentar o investimento
em educação (com o orçamento inalterado), necessita-se reduzir a parte dos
outros itens da sua “cesta” de investimentos. Se o investimento em educação for
elevado, portanto, de 25% para 35% do orçamento, os outros itens PRECISAM ser
reduzidos de 75% para 65%. E como fica então saúde, segurança, “transporte”, e
tudo o mais que for demandado?
Torna-se
claro, assim, que as demandas por MAIS serviços do Estado apenas repercutem na
questão: como financiar MAIS bens públicos sem exigir MAIS IMPOSTOS da
sociedade?
Caso essa
resposta fosse fácil, o problema econômico fundamental, a escassez, certamente
seria abolido.
A sociedade
deve, portanto, ser racional em suas reivindicações: pode-se SIM cobrar mais do
Estado, mas saber que o custo será, necessariamente, ou mais impostos, ou
redução na quantidade e qualidade dos outros serviços prestados.
Exemplo
prático para o caso brasileiro: antes do Brasil retornar a democracia, o Estado
desempenhava um papel crucial nos investimentos em infraestrutura, mas ao mesmo
tempo realizava um baixo investimento em programas sociais. Foi justamente após
o rearranjo da atuação estatal, que o Estado pode se engajar em programas
sociais e distributivos, como o programa bolsa família.
Consultar os
dados de parcela do orçamento público aplicado em investimento (infraestrutura)
e programas sociais torna clara a restrição orçamentária: houve redução
percentual naquela e elevação percentual nesta. Em suma, o Estado deixou de
investir para poder distribuir. Assim, grosso modo, para poder ter o programa
bolsa família e outros programas sociais, custou ao Estado se afastar da
infraestrutura: custaram as privatizações (“concessões”), que frequentemente
tanto se reclama e vilipendia.
Certamente, a
sociedade tem legitimidade em expor sua pauta de reivindicações. Mas também
deve reconhecer que escolhas trazem consequências, e com ela, seus custos.
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